Só haverá paz, quando a PM acabar

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Relatos de moradores dão conta de 14 corpos.

Os tempos estão difíceis para ser negro e pobre no Brasil. Sempre foi. Nós só estamos vendo, em tempo real, a máquina de morte trabalhando.

O assassinato de um PM dentro da viatura foi a razão da Chacina do Complexo do Salgueiro. Primeiro, que foi vingança, segundo, que foi chacina sim.

Terceiro: que os BOPE, os PM e os apoiador de bandido fardado tão comemorando desde cedo em grupos de zap. Cada corpo deitado no mato, amontoado, degolado, envolvido em lençol, é festa pros PMs, que celebram “mais um CPF cancelado”. Já pensei se PM tinha mãe, hoje não tenho dúvidas:

Eles brotam do inferno, não de ventre.

Quem vem de ventre é ser humano, animal, ser vivo. Demônio sobe da profundeza do mal, cheirando a podre, a medo, frustração, ódio.

O policial é um frustrado, porque não conseguiu ser outra coisa na vida, além de capacho de comandante agiota, traficante, miliciano. O policial é um garçom dos comandantes. Ele sabe que não vale nada. Que o Estado não vai pagar nada pra família se ele morre. Eles imploram por centavos, e como o Estado não dá nada, eles vão pro crime.

São igualmente pretos e pobres, e nordestinos, e brancos pobres.

Mas quando vestem a farda, incorporam Satanás.

O Diabo Veste Farda.

A “operação” (leia-se: CHACINA) no Salgueiro teve um único objetivo: matar.

Matar todo mundo.

Só matar.

Aterrorizar pessoas, trabalhadores, estudantes, mulheres, homens, pessoas que estão neste momento sozinhos no IML, sem comer, sem dinheiro pra agir um caixão. Sem respostas. E muitas, muitas perguntas.

A PM não vai responder por nada.

São covardes.

Desde Amarildo, vejo de perto o menosprezo que eles tem por pobres e negros. Odeiam a si mesmos. A farda os faz se sentir melhores. São possuídos por uma legião de demônios que bebem sangue.

Nós estamos cansados.

A favela não é o problema.

O povo não é o problema.

O negro não é o problema.

Essa polícia é o problema.

Não podemos ter uma polícia como essa. Essa polícia tem que acabar.

Se isso fosse numa Alemanha, todos eles estariam presos antes do fim do dia. Mas no Rio, não apenas estão soltos, como vão na pizzaria hoje a noite, rir, comemorar, festejar o sangue inocente.

Essa polícia é assassina, maldita e duas vezes filha do inferno.

Cada corpo caído no Salgueiro hoje, tem um pouco de nós.

Descansem. Se em paz, não acredito.

Só haverá paz, quando a PM acabar.

Escritor e ativista social, nascido em Madureira, Rio de Janeiro. Em 2016 lançou Rio em Shamas, indicado ao Jabuti de 2017, pela Editora Objetiva. Foi roteirista na Rede Globo e Multishow/A Fábrica, colunista da Folha de São Paulo e Metrópoles.

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